segunda-feira, 21 de abril de 2008

De que falam duas velhas numa noite à janela ?

De que falam duas velhas , à janela,
numa noite de primavera ?
Duas velhas têm muito tempo para falar,
têm o tempo da vida que viveram
e têm o presente, que é infinito
o infinito da disponibilidade de ser velho
de estar à janela,
numa noite de primavera,
e de não ter de pensar no imediato futuro
que torna o presente um
ponto de passagem apenas
para um outro futuro
e outro e outro, sempre incessantes.
duas velhas de que falarão então ?
Duas velhas, numa noite de primavera,
falam dos filhos que não tiveram,
dos maridos que morreram,
da sua própria morte que ainda falta viver,
e do tempo, que na primavera muda da manhã para a tarde.
Falam dos netos quando os há,
Falam dos vizinhos, sempre os mesmos...
Duas velhas falam de quase tudo,
falam da solidão que as trouxe à janela,
da noite que lhes fez o frio,
e do escuro de estarem sozinhas.
Duas velhas, à janela,
numa noite de primavera,
falam de muita coisa
e até do rapaz que lhes tira uma fotografia.

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