terça-feira, 1 de janeiro de 2008

Não sei quantas almas tenho

Não sei quantas almas tenho.
Cada momento mudei.
Continuamente me estranho.
Nunca me vi nem acabei.
De tanto ser, só tenho alma.
Quem tem alma não tem calma.
Quem vê é só o que vê,
Quem sente não é quem é,


Atento ao que sou e vejo,
Torno-me eles e não eu.
Cada meu sonho ou desejo
É do que nasce e não meu.
Sou minha própria paisagem;
Assisto à minha passagem,
Diverso, móbil e só,
Não sei sentir-me onde estou.


Por isso, alheio, vou lendo
Como páginas, meu ser.
O que sogue não prevendo,
O que passou a esquecer.
Noto à margem do que li
O que julguei que senti.
Releio e digo : "Fui eu ?"
Deus sabe, porque o escreveu.

(citando Fernando Pessoa)

2 Comments:

Anónimo said...

Porque as palavras deste homem são eternamente contemporâneas.
Porque sente o que todos sentem, mas sabe exprimi-lo com o desassossego exacto.
Quem me dera viver no seu tempo...ou que o meu tempo o trouxesse de volta.
Um beijinho

Liliana Jasmim said...

As palavras de Fernando Pessoa, suscitam tanta coisa...acho que é impossível cansarmo-nos de ler os seus escritos, porque cada verso é uma descoberta do que há dentro de nós...e o que nos cerca...