As palavras são coisas e tudo move um grito existencial!
Estou a escrever o livro do silêncio, tomado das verdades semeadas, com os papeis e as cores do tempo, a cal que absorve até ao último fim. Um ser estranho como eu nunca poderá publicar um livro! Os rumores são ideias viscerais, frutos do âmago, cuja existência funda, adormece em cima de um balcão, admiravelmente cheio de chávenas e copos distraídos. Falei-te muitas vezes de escrever um livro, desisti sempre! O meu livro é a existência, cada um lê as suas páginas enquanto o tempo passa, com os pormenores, as lembranças e a saudade… este livro é de todos e todas as interpretações se conjugarão no todo, um todo que se toma por sempre inacabado. Tu escreves um livro, esse é o meu livro!
A essência do meu livro é o tempo, a tua colaboração é o que fará de ti importante para mim. Leio muitos livros, escrevo bastante e tudo o que escrevo considero como consideras o que escreves. Perde-se tempo com inutilidades e a vida não se repete, mas o livro fica. O meu livro possui coisas que tu não deves ler, são verdades quase assassinas. A tua postura ainda que elevada, poderá não servir para nada… também consigo encontrar em ti a inutilidade, não devia dizer-te isto! Lanço no meu cemitério a cal bem branca e na noite escura acontece o silêncio negro… a cor da capa, essa que cobre a cor dos rótulos! Tudo em todo o tempo desvela infindas posturas enquanto a deusa morte não chega! A acomodação inquieta o silêncio… no concerto de todas as invenções. O inevitável é este estado embaraçoso, a vergonha esquecida, cuja densidade toma o padrão do ar que se respira. As imagens cilíndricas absorvem o gesto final, pelo amor diferente, no corpo doente do livro que se perdeu e no tempo se escreveu.
O meu livro tem barbas, muitas feridas, o ódio e a história da morte… um dia entenderás o meu livro! Pedi-te ajuda… apenas ficou o silêncio, nem uma palavra, tornei-me anti-social, porque o meu livro apenas está em memória. Estas são páginas da minha memória, cheias de um licor precioso, branco ou vermelho, esperma ou sangue, simplesmente é a minha vida. Guardei nos sons o medo da morte, numa linha quente, a metafísica da psicose, não que fosse mais, mas apenas eu, com toda a minha revolta entre os parágrafos que estão por acontecer! Embebedo-me de palavras, por orgasmos múltiplos, neste silêncio que a alma tece enquanto a barba cresce. Por todos os dias sou um ser diferente, confesso que não me conheces… algo fica por se concretizar.
Hoje fumei dez cigarros enquanto escrevia este texto, depois de chegar a casa toda a roupa vai para a lavandaria, não a das ideias, a outra. Não me perguntes mais, este é o meu livro, os tecidos da minha alma. O comboio ficou esquecido, no hospital vazio, acordado pela melancolia dos papeis e os lados sinuosos do imprevisto, alguns coloridos pela força do ócio… este estado de marasmo por que me encontro, desencontrando-me. As minhas palavras transpiram em demasia enquanto passas e o ódio se avoluma, como consequência dessa postura, dessa indiferença face à minha solicitação. Apenas escutas o que te interessa para te promoveres, jogando com uma falsa humildade, o lado maléfico que descubro em ti. Publicar um livro?
O humano é um mistério que surpreende todos os dias. Estamos todos à espera do mesmo fim, o fim que vai acontecendo como o cintilar das estrelas no céu, como os copos de cerveja que se vão tomando pelo mundo inteiro, como os cigarros, também todas as gansas, desde aquela que apanhei a sexta-feira! O meu livro é o fruto da gravidez do entendimento e da sensibilidade, regado com o vinho do bem e do mal, ante a orquestra de Deus e do Diabo! Compassos de ajustamento e de interpretação, na rua dos nomes, onde mora a edição do selo branco que beija o documento a oficializar a situação.
Este é o meu cemitério de palavras! Tenho agora um tempo, o tempo que te dedico, enquanto vivo, vivo à medida do meu modo de ser, ainda que nunca tenhas sido nada para mim. No mistério do medo guardas uma resposta inteligente, de acesso restrito, em conformidade com os princípios anteriores. O vazio ainda não morreu, está dentro de outro vazio, a profundidade é o amor que nunca encontrei… vou escrever um livro.
Vila Franca de Xira, 05 de Novembro de 2007 – 16:57h
Jorge Ferro Rosa Escrito no café “Plaza”
in Caderno da Alma
Nota: a pintura (montagem)acima foi por mim trabalhada em computador.
segunda-feira, 5 de novembro de 2007
VOU ESCREVER UM LIVRO
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