quinta-feira, 22 de novembro de 2007

viagem de autocarro à distância da saudade

No plano raso de terra estéril está a árvore.O dia apaga-se, como tempo depois, também o amor viria a apagar-se. Mas o disfarce ainda nem se supõe e é o sol que, em memória, me traz o beija-flor à distância do abraço adiado.A árvore, cercada de nada, num quase vale de delícias, não fosse a aridez da pedra da estátua inexistente, acena-me com braços de vento, num baile de pura sedução.- Não posso! – grito-lhe. E a estrada corre sob o meu corpo que quer a eternidade. E sinto, sinto a fuga e a urgência de parar o tempo na magia daquele instante. Volto-me numa ânsia de dor sôfrega, abafada, olho pelo vidro, embaciado de suspiros alheios e dói-me aquela imagem que foge de mim para nunca mais. E a corrida continua. Apressada, como se o azul que se adivinha não esperasse, ou as casas, já acesas, fossem engolidas pela espuma negra dos rochedos.
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A árvore já não é, e uma não sei que tristeza profunda vem beijar os meus olhos de água. Quero as palavras. No desespero do impossível, grito à nudez da praia, onde delicados grãos intemporais respondem aos meus gestos desencontrados. E digo ao amor a beleza de um deserto, onde só uma palmeira e um sol que morria, anoitecendo a paisagem apressada, faziam a vida daquele lugar.
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Há muito que não vejo a árvore. Deixou-se ficar na planura e é, talvez, já pertença de outros olhares ternos e acabados, para o recomeço adiado num qualquer tempo desconhecido. Tal como o abraço da distância, reduzido à imagem quadrada de palavras desenhadas de vazio. Ou talvez não.
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Fiz a fuga para a ilha e, longe da imensidão de horizontes e lendas, subo a rua que se estende pela encosta, numa subida grande, ansiosa. Lá no cimo, está um cristo ressuscitado e de olhar reprovador. Digo-lhe que a Primavera chegou e que os montes de sol e nuvens têm árvores em flor, que me asseguram que o destino vem na pétala da rosa que arde.
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Esquecido na concha, o cigarro apagou-se. A música parou.Só o silêncio embala as paredes de ecos e risos sossegados.Só ele conhece que, na vida, há um vaso aberto em cheiros.Só ele se embriaga com a essência do vento a passar nos pinheiros nus.
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O silêncio é o mundo adormecido num prazer inquieto.O silêncio sou eu.
(2002)

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