sábado, 1 de março de 2008

O não-amigo

Ele não era um ser social mas, naquele dia, não conseguira evitar os amigos. Todavia, como não gostava de partilhar ideias com ninguém, ficou sentado a escrever num papelinho pequeno e amarrotado, enquanto os ditos amigos falavam: «Apetece-te matar. Apetece-te ver morrer. Tens os teus melhores amigos à frente. Ouves belas conversas. Piscas o olho quando ouves alguém dizer qualquer coisa engraçada. Sorris porque não tens nada a dizer. Estás com os teus amigos, no entanto, nunca como agora te deu tanta vontade de partir os ossos a uma cara humana. As mulheres da mesa ao lado são muito bonitas. Mais do que bonitas: atraentes. Do mesmo modo que há mulheres bonitas que não nos atraem, há mulheres feias que primam pela sensualidade. No caso das mulheres da mesa ao lado, poder-se-ia dizer que são belas e atraentes. Queres tocar-lhes. Têm o cabelo tão lavado. Exalam um cheiro tão agradável. Sentes vontade de entrar em comunicação com elas. As mulheres fazem falta aos homens. Óbvio, não? Deveria ser. Queres beijar todas as mulheres que estão sentadas na mesa ao lado. Por ti, enfiarias a língua nas bocas de todas elas. Esquece isso. És um assassino. Não. És um louco. Apesar de nunca teres matado ninguém, poderias fazê-lo sem hesitar dois segundos. E dois segundos é tão pouco tempo. Queres matar. Vais matar Se não tivesses nascido para realizar as tuas vontades, teria conhecido este planeta em vão. Mata um dos teus amigos. Olha para a cara deles: todos tão contentes. Espanca-os.»

Os amigos olhavam para ele. Ele olhava para os amigos. Um deles chamou-o à conversa. Não lhe apetecendo responder, permaneceu com os dentes cerrados e continuou a escrever: «Estás a ver aquele homem de cabelos brancos e de voz grossa? Estás a ver aquele homem que te enoja profundamente? Enfia-lhe um pontapé no rabo, desgraça-o, acaba com ele. Faz dele o que todos têm feito de ti.»

Levantou-se. Sorriu. Adeus, até amanhã.Não olhou para os lados a atravessar a estrada. Foi atropelado e morreu.

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